quinta-feira, 2 de julho de 2009

existe algo de podre no recôncavo baiano?

Dizer que baiano e índio são preguiçosos é uma citação demodê, pra não taxar de preconceituosa. Os índios, eu vou deixar para os amigos antropólogos: eles podem elaborar uma defesa melhor do que a minha. Mas por favor. Eu não estou dizendo que índio é assunto exclusivo da antropologia. Ou que "índio é coisa de antropólogo". É bom registrar porque, vocês sabem, a patrulha politicamente correta apita por qualquer questão, ainda que não haja necessidade: uma vez que o bom senso e o livre arbítrio ainda fazem parte da constituição humana.
Então, eu vou me ocupar dos baianos. Pra começar (já que sempre se começa pelo clichê), eu vou dar uma de gringo: falar em baianeidade é lembrar de acarajé quente, pelourinho, jorge amado, capoeira, candomblé, umbanda e.... vá lá, é preciso citar o axé. Tudo muito apimentado porque baiano não nasce, baiano estréia. Na Bahia, ninguém é príncipe, todo mundo é rei.
Eu já fui à Bahia quatro vezes. Não é muito, mas já rende algum pano pra saia rodada. A primeira vez foi há mais ou menos dez anos, nem faculdade eu fazia. Tenho uma prima queridíssima que mora em Ilhéus. Foi a única vez que fui lá... porque depois o meu tio casou com uma mulher deplorável. Eu tenho certeza que ela amarrou na encruzilhada. Mas por favor. Eu não estou dizendo que "todo baiano é macumbeiro". Até porque macumba é algo tão factível quanto a bat caverna: se você acreditar, acaba conseguindo enxergar no escuro.
Eu não gosto da mulher do meu tio pois não gosto do homem que ele se tornou depois dela. Quando eu fui pra lá, há dez anos, o meu tio contratou uma cozinheira pra receber a mim e à irmã dele. Fala sério: uma baiana pra fazer o seu almoço é muito luxo. Passei 15 dias comendo tudo que vivia dentro do mar, coberto com bastante pimenta. Engordei deliciosamente três quilos. Além disso, meu tio desempoeirou todos os vinis do led zepplin que ele tinha, pra eu ouvir: coisa linda. E como se não bastasse, houve três ou quatro vezes que ele voltou do trabalho com ingressos de shows pra mim e pra minha prima. E ele ia nos shows com a gente: tomava uma cervejinha, escutava metade do show e nos dava a grana do táxi pra voltarmos pra casa. Na boa, esse é o tio que todo mundo pediu a Deus. Mas há mais ou menos cinco anos, ele casou com uma nojenta e não recebe mais os parentes da ex dele em casa: trata-se, por exemplo, do meu caso. Quando meus pais e meus dois irmãos foram pra Ilhéus (e se hospedaram em hotel), meu tio teve que encontrá-los num restaurante. Meu irmão, um moleque que tinha cerca de doze anos na época, foi esculachado da casa do primo pela mocréia. E é bom deixar claro: quando meu tio me recebeu, a minha tia já era ex há anos.
Depois, eu fui a Porto Seguro: o segundo reveillon de uma pessoa universitária. Fui com uma amiga que eu adoro, que é um grande exemplo pra mim. Mas. Ela estava com o bofe por lá e, vocês sabem, ele sujou a foto. Ficamos na casa da tia dela: uma simpatia, dona de uma escola de balé e de uma boa reserva de uísque. Foi legal: era a segunda vez que eu passava o reveillon numa cidade praiana (duas horas da manhã eu estava batendo o maior papo com Iemanjá). Mas pensem no arrependimento amargo que rolou quando eu encontrei outro amigo (que tinha ido de ônibus com a gente), e ele me disse: você tinha que ter vindo pra Arraial da Juda comigo - na casa onde estou tem um jardim especial, e de dia você escuta blues nas barracas da praia. E eu quase pra ter uma overdose de axé: axé e nada mais, axé sem guaraná, cowboy.
Só depois que eu conheci Salvador. Dessa vez, eu não tenho do que reclamar: fui a um congresso de comunicação onde havia mais de mil estudantes de todo o Brasil. A gente acampou no campus da UFBA por cinco dias. Eu não assisti nenhuma palestra, nenhum debate, não fiz nenhum workshop, nada. Nem ponho no meu currículo. Eu só tomava café no campus e voltava pra tomar banho e participar do esquenta da noite. Essa foi uma daquelas viagens pra guardar no coração porque na mente não deu pra guardar muita coisa não.
Na segunda vez que eu fui a Salvador, eu estava com meus pais. Aí o estresse vem junto com o pacote. O lado bom é que eu fiquei em hotel e comi em restaurante. Mas teve um dia, um dia pra manter o respeito, em que eu fiquei na feirinha enquanto meus pais subiam o elevador Lacerda. Papo vem e papo vai com o hippie que estava montando um brinco pra mim... e a gente teve a mesma idéia. Eu não tenho mais o brinco, mas achei legal poder criá-lo junto com o cara e achei divertido trocar aquela idéia com ele. Quando meus pais desceram, já estava escurecendo, e meu pai se perdeu horrores pra chegar ao hotel: foi ficando cada vez mais estressado, xingando todo mundo no trânsito... e eu nem verde.
Tem dois anos que eu não vou à Bahia... mas vi que esse ano haverá concurso na área de cultura por lá. Porque se é pra ser neoburocrata, meu senhor do Bomfim, que seja na praia.
Enquanto isso, eu estou tentando conhecer melhor um certo baiano que está muito longe de casa. Vocês sabem, tem horas em que a saudade aperta.

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